O calendário brasileiro colocou os Estaduais numa posição um tanto ingrata, especialmente para os clubes economicamente mais poderosos do país. Perder significa instabilidade, pressão. Ganhar conduz a uma alegria efêmera. Após vencer com autoridade o Carioca, o Flamengo vive momento similar ao do ano passado, quando passeou até ser campeão: se o ano for extremamente vencedor, o título do último domingo será incluído na contagem das taças; caso não venha outra conquista até dezembro, ninguém lembrará do Estadual como um crédito capaz de fazer com que a temporada deixe boas recordações.
O Carioca apresentou as muitas virtudes do time de Filipe Luís, alertou para um ponto de preocupação, mas também permitiu refletir sobre o futuro na temporada. Ser campeão do Rio não garante nada para as demais competições do ano, mas ajuda a ter uma fotografia do time atual.
Hoje, é fácil apontar alguns traços de identidade do Flamengo de 2025: é possível saber que, a cada vez que entrar em campo, a pressão sobre a saída de bola do adversário será forte, a linha defensiva estará sempre jogando o mais à frente possível e a equipe tentará ter o comando das ações. No entanto, nada se destacou tanto no Carioca quanto a capacidade de gerar vantagens e situações de gol a partir da saída de bola, como mostram as imagens desta coluna.
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Na primeira, Pulgar tem a bola entre os zagueiros, na altura do meio-campo. Lima e Cano fazem a pressão, mas orientam o corpo de costas para a linha lateral: querem induzir Pulgar a fazer o passe pelo centro, zona mais congestionada. E aí entra uma das características dos zagueiros, volantes e até do goleiro Rossi: a calma com a bola, a disposição de apenas soltá-la quando uma vantagem está gerada. Como não há vantagem, Pulgar volta a bola até o goleiro, como o Flamengo faz várias vezes.
A seguir, sem pressa, Rossi pisa na bola e espera a pressão do Fluminense se aproximar. O Flamengo aposta que a bola seja um elemento de atração dos rivais, e o goleiro só dá o passe para Léo Pereira quando Cano, Lima e os dois volantes tricolores se adiantam.
O resultado é o espaço entre meio e defesa do Fluminense, ocupado por Gérson. A partir daí, os rubro-negros trocam passes curtos até acelerarem o jogo: Arrascaeta coloca Luiz Araújo em condições de marcar. A alternância de ritmo, dos movimentos pacientes na saída de bola até o momento de acelerar, é marcante num Flamengo que atrai o adversário para depois atacar.
Mas, se este é o presente, cabe também pensar no futuro. E há respostas que só o desenrolar da temporada pode trazer. Uma questão é como os adversários do Campeonato Brasileiro vão lidar com a saída de bola do Flamengo. Ela está entregue a zagueiros e volantes técnicos, com mecanismos muito bem trabalhados por Filipe Luís. Os rivais seguirão arriscando subir a marcação e ceder espaços às costas? Ou, para neutralizar tal saída, simplesmente deixarão de pressionar, obrigando o Flamengo a atacar defesas posicionadas atrás?
Outra questão é como o modelo ofensivo vai se adaptar à entrada de Pedro. O centroavante não é o tipo de atacante habituado a correr em profundidade, a acelerar quando o time sai da pressão rival. Por outro lado, um atacante deste nível abre inúmeras outras possibilidades de jogo, especialmente quando o Flamengo enfrentar defesas fechadas. Ou seja, evitando que os rubro-negros dependam do espaço gerado por rivais que os pressionem. E se haverá adaptações a fazer na forma de atacar, também será preciso mudar a forma de pressionar rivais: Pedro e Arrascaeta não são especialistas no tema.
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E se há um ponto que pode ser delicado, este é a formação de um elenco que acumula jogadores mais confortáveis pelo lado do campo do que pelo centro do ataque. Mais do que isso, os atacantes do Flamengo não têm um histórico de temporadas goleadoras – e é arriscado depositar toda a expectativa de solução na volta de Pedro.
Considerando números absolutos e média de gols por minuto, Plata teve como melhor ano os 11 gols pelo Al Sadd em 2023-2024, marcando uma vez a cada 240 minutos – dois jogos e meio. Antes, sua melhor marca fora os seis gols em 2021-2022 pelo Valladolid, com um gol a cada 321 minutos – três jogos e meio.
Desde sua ida para a Europa, Éverton Cebolinha tivera os 8 gols em 2020-2021 pelo Benfica como melhor marca. No Flamengo, tem 15 gols em 6.692 minutos de futebol, ou seja, um a cada 446 minutos – algo em torno de cinco partidas. Tampouco Luiz Araújo tem marcas expressivas, com sete gols em 2024 pelo Flamengo, um a cada 431 minutos. Já Bruno Henrique, que teve temporadas extremamente goleadoras pelo Flamengo, chegou aos 34 anos e, naturalmente, vê seu tempo em campo e sua média de gols cair. Acima de tudo, é um atacante que precisa de um contexto especial para seu jogo, assim como Juninho, que mostrou no Fla-Flu ser útil em diagonais do centro para o lado do campo, ligando ataques em velocidade. Se fará muitos gols no futebol brasileiro, é cedo para garantir.
Claro que o crescimento coletivo pode fazer estes jogadores marcarem mais gols, mas, por ora, são muitos os jogos em que o Flamengo domina e chega ao fim das partidas com placar apertado. No Campeonato Brasileiro, o preço pode ser alto.
Mas tudo isso são projeções de um campeonato que sequer iniciou. E o Flamengo de 2025, por ora, gera mais expectativas positivas do que negativas.
Fonte: Netfla